domingo, 21 de setembro de 2008

O Desenraizamento Sócio-Cultural nas Atitudes do Personagem Gregório em "A Metamorfose"

UNIVERSIDDAE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ – UVA
CENTRO DE LETRAS E ARTES
CURSO: LETRAS
DISCIPLINA: PRODUÇÃO TEXTUAL

O Desenraizamento Sócio-Cultural nas Atitudes do Personagem Gregório em “A Metamorfose”
Allana Gizele Vasconcelos
Aluna do 4º período do curso de Letras da UVA

O ser humano está perdendo a sua identidade cultural. Isso o torna um ser desenraizado, privado de seus bens desde coisas simples como a casa até sua própria família, sua cultura, devido à ausência afetiva familiar ou do seu grupo social, e ao individualismo presente na sociedade moderna. Ecléia Bosi chama esse desenraizamento de “a mais perigosa doença que atinge a cultura” (BOSI,2006. p.18).
Na história da colonização, os portugueses apropriaram-se do território brasileiro e principalmente daqueles que aqui moravam transformando sua vida, atividades por ele praticadas e sua cultura, em virtude de apresentarem objetos a eles desconhecidos. Darcy Ribeiro comenta que o índio se desembestou enlouquecido, contra outros índios e até contra seu próprio povo por amor a essas preciosidades” (RIBEIRO,2002. p.48). Desiludidos por contato pacífico, lutaram para preservar a sua vida, embora estivessem contaminados pelo espírito de individualidade trazido pelo Europeu. Isso é observado pelo enfrentamento das tribos. Tronaram-se estrangeiros em sua própria terra.
Em a metamorfose, Gregório tem sentimento semelhante, quando pela descoberta dos pais que havia se transformado em um inseto, foi isolado e tratado como animal em sua própria casa. Um estranho que já não era reconhecido por sua família. Ele passou a viver em um cativeiro como forma de amenizar os incômodos que, a partir de então, causaria a família, e também pelas dificuldades encontradas para se relacionar com os mesmos, afastando-se da sociedade e do trabalho do qual também é rejeitado.
Nesse ponto, pode-se constatar o individualismo presente na obra. Gregório que sustentava a família foi visto por essa como um ser inútil. Ele é querido por todos até o momento da sua metamorfose. Esse individualismo está relacionado principalmente ao ”poder disciplinar”, que cuida e regula as atitudes humanas do indivíduo e do corpo. Através da vigilância, os sujeitos são postos na individualidade para controle dos mesmos. Stuart Hall afirma que “quanto mais coletiva e organizada a natureza das instituições da modernidade tardia, maior o isolamento, a vigilância e a individualização do sujeito individual” (HALL,1992:43). O individualista por ser racional deixa de lado as emoções e reage com a cabeça, a razão.
Assim fez a família de Gregório, quando este se transformou em animal, jogou-o ao quarto, escondendo-o por vergonha, uma vez que o consideraram incapaz de trazer à família recursos financeiros. Aqui se encontra presente a desvalorização da pessoa e consequentemente da sua cultura bem como a atitude blasé. Ele é então “desligado de seu passado, o que significa dizer exilado de sua própria história.” (CHAVES,2005. p. 47).
Vale ressaltar a atitude blasé presente nessa rejeição. É a partir desse efeito que se perde a identidade do indivíduo. Simmel postula que “a essência da atitude blasé consiste no embotamento do poder de discriminar” (SIMMEL,1902. p.16). A perca dessa sensibilidade faz os objetos perderem valores, são privados de substâncias e, dessa maneira, um não exerce preferência sobre o outro. É possível abordar a questão financeira. O dinheiro segundo Simmel é o maior dos niveladores “arranca irreparavelmente a essência das coisas, sua individualidade, seu valor específico e sua incomparabilidade” (1902. p.16).
O personagem percebe os acontecimentos da casa através das vozes e da maneira de andar dos familiares. Ele preocupa-se a todo instante com os parentes, com as dificuldades financeiras enfrentadas por eles, com a mãe doente, com a irmã que o visita às escondidas, levando-o alimentos, ele analisa suas reações para depois melhorar até mesmo o ambiente em que se encontra. Essa é a única demostração de sensibilidade tida pela família para com Gregório.
Ao final da obra, Gregório morre, a família comove-se, embora acreditando que já deveria ter acontecido. Partem então para uma nova casa, uma nova vida. É uma representação de todas as culturas que passam por um desenraizamento. Vão aos poucos se perdendo no tempo, embora para as pessoas que são envolvidas nessa mudança, a sua cultura não acaba por inteiro. Elas querem sempre repassar o que lhes foi ensinado e aprender o novo. Quando isso não acontece, há o estranhamento, o desenraizamento cultural e familiar.

Referencias Bibliográficas
BOSI, Ecléia. Cultura e Desenraizamento. In: BOSI, Alfredo(org). Cultura Brasileira – Temas e Situações. 4º ed. SP: Ática,2006
HALL, Stuart. A Identidade Cultural na Pós -Modernidade. 7º ed. Rio de Janeiro: DP&A,2002
SIMMEL,George. A Metrópole e a Vida Mental. In: O Fenômeno Urbano. Rio de Janeiro: Zahar ed.,1902
CHAVES, Rita. Angola e Moçambique - Experiencia Colonial e Territórios Literários. ed. Cotia .2005
RIBEIRO, Darcy. O Enfrentamento dos Mundos. In: O Povo Brasileiro a Formação e o Sentido do Brasileira. 2º ed. São Paulo: Companhia das Letras,1995.
KAFKA,Franz. A Metamorfose. Disponível no site: virtualbooks.com.br. Acessado em 24/07/2008

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