quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Letrasuva: HISTÓRIA, HETEROGENEIDADE E INSEGURANÇA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO

Letrasuva: HISTÓRIA, HETEROGENEIDADE E INSEGURANÇA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO

HISTÓRIA, HETEROGENEIDADE E INSEGURANÇA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO

UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ – UVA
CENTRO DE LETRAS E ARTES
CURSO: LETRAS HAB. LÍNGUA PORTUGUESA.
DISCIPLINA: HISTÓRIA E VARIAÇÃO LINGUÍSTICA
PROFESSORA: JANAÍCA MATOS. SOBRAL-CE/2009.

HISTÓRIA, HETEROGENEIDADE E INSEGURANÇA DO PORTUGUÊS BRASILEIRO
JOSÉ MARIA VASCONCELOS MARANHÃO
ROSIANE OLIVEIRA FREITAS


Sabemos que a língua portuguesa sofreu em princípio um sincretismo enorme de falares europeus, principalmente, do espanhol e da língua falada na Galiza. Esta língua européia teve sua história particular vinculada ao surgimento de seu país, Portugal. Como expressão cultural e de identidade de um povo, passou – se a haver uma valorização dessa classe de signos lingüísticos comum, e com isso incentivou – se a difusão dessa expressão cultural em todos os anexos do trono português.
Segundo Silvio Elia a língua lusitânia teve três fases, a Lusitânia Antiga, compreende Portugal, Madeira e Açores. A Lusitânia Nova, que corresponde ao português do Brasil. A Lusitânia Novíssima abrange as cinco nações africanas constituídas do dito processo de “descolonização” e que adotaram o português como língua oficial: Angola, Moçambique, Guiné – Bissau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe. Durante essas fases, portugueses tentaram implantar sua cultura e religião em cada país acima citado, por se considerarem superiores e civilizados, mas o que não se esperava era que a língua evoluísse tanto e estivesse tão ligada a história e cultura de um povo.
Da mesma forma que o português de Portugal teve seu processo de evolução ligado a cultura e identidades dos falantes. O português falado no Brasil também passou por várias fases. Do ponto de vista lingüístico não havia unidade e sim diversidade de falares, no Brasil no momento calcula – se que seria possível a existência de mais de 350 línguas indígenas. O professor Ayron Dall’ Igna Rodrigues citado por Bagnon distingui – as em troncos, famílias e linguas isoladas, os troncos são o Tupi e macro – jê; as famílias subdivide – as em Caribe, Aruaque\ Arauá, famílias menores do sul do Amazona e línguas faladas em regiões inóspitas. “Apesar dessa enorme dispersão geográfica, as línguas da família Jupi – Guarani mostram muito pouco diferenciação” (Elias, Silvio, 2001, p – 22)
Quando os jesuítas chegaram ao Brasil, eles tiveram primeiro que apreender a língua dos índios, eles tiveram primeiro que aprender a língua dos índios, então buscaram as línguas mais faladas e deram o nome de língua geral, essa língua popular, geral a índios, missionários, aculturados e a não índios ficou também conhecida como língua brasílica. Logo depois os europeus foram mais ríspidos e impuseram com mais vigor as normas de seus falares.
Na segunda metade do século XVI começou a chegar ao Brasil negros africanos vindos para trabalhar como escravos, e também eram obrigados a assimilar essas nova linguagem, porém eles já tinham as suas. A migração negra para o Brasil teve dois focos principais de procedência, correspondentes aos dois grandes grupos: os sudaneses oriundos da região do golfo da Guiné, o Senegal e a Nigéria; os bântus, originários do Congo, de Angola, de Moçambique e parte sul da África. Duas línguas principais caracterizam estes grupos: ao norte na Bahia, o nagô ou ioruba, ao sul (Rio de Janeiro, Minas Gerais) o quimbundo.
Em meio a toda essa mistura de raças e culturas diferentes começou surgir uma sociedade nos moldes portugueses, os colonizadores passaram a impor sua religião, a ensinar leitura através de livros lusitanos, deixando bem claro sua superioridade e reprimindo qualquer tipo de não aceitação. Entre nós não se formou um dialeto propriamente “crioulo”, mas como afirmou Serafim da Silva Neto, se formou um dialeto semi – crioulo, resultado da fusão de tantas raças e culturas juntas.
Tem – se dado ultimamente relevo indevido à Lei do Diretório de 03 de maio de 1757, de inspiração pombalina, que proibia o uso da língua geral nas escolas brasileiras, nas quais só se devia ensinar a língua portuguesa, de Portugal, que nunca se falou por aqui. Curioso é que mais tarde o Brasil passou a ser visto como país com unidade lingüística bem definida pelos europeus, enquanto que os cidadãos tupiniquins penavam para se adequar as regras imposta por outros.
Desde a obrigação imposta pelos portugueses até nossos dias podemos perceber até entre os intelectuais um certo repúdio pelo português falado aqui, pois consideram nosso falar uma corrupção ao português legítimo, consideram nossa língua como sendo de matutos, caipiras, infelizes, um arremedo tosco da língua de Camões. É o que escreve Arnaldo Niskier, presidente da academia brasileira de letras, num artigo publicado na folha de São Paulo (15\01\98). “A classe dita culta mostra – se displicente em relação à língua nacional, e a língua indígena”.
Declarações deste tipo se baseiam apenas em posturas preconceituosas, perpetuadas ao longo dos séculos pela desinformação ou má informação do que se em análises cientificas acurados dos fatos lingüísticos. Como afirma o filólogo Candido Figueredo citado por Bagno (2001):

Quanto mais progressiva é a civilização de um povo, mais sujeito é a sua língua a deturpações e vícios, sob a variada influência das relações internacionais, dos novos inventos, dos travancos da ignorância, e até do capricho da moda.


O brasileiro sabe português, fala bem o português que ele tem contato, e que sofrem diversos processos de variações, tanto sincrônicas, como diacrônicas. Do ponto de vista lingüístico, porém, a língua falda no Brasil já tem uma gramática, isto é, tem regras de funcionamento, que cada vez mais se diferencia da gramática da língua falada em Portugal. Na língua falada as diferenças são tão grandes que muitas vezes surgem dificuldades de compreensão. Por exemplo, os pronomes o\a, de construções como “eu o vi” e “eu a conheço”, estão praticamente extintos no português falado no Brasil, ao passo que no de Portugal continuam firmes e fortes. Nossas crianças sem problema “me” e “te”: “Ela me bateu”, “Eu vou te pegar”, mas o\a jamais são substituídos por ele\ela. Se as crianças falam assim é porque elas escutam assim, tanto aqui como lá.
O único nível em que ainda é possível uma compreensão quase total entre brasileiros e portugueses é o da língua escrita formal, porque a ortografia é praticamente a mesma, com poucas diferenças, o que é lógico, já que eles ditam as regras e ainda querem impor seu poder através da língua em sua eterna colônia, que agora conta com aproximadamente 170 milhões de falantes.
O grande problema do ensino do português no Brasil é que até hoje os professores continuam voltados com os olhos para a mesma lingüística de Portugal. As regras consideradas certas são aquelas usadas por lá, que servem para a língua falada lá, e com isso cria – se a impressão de que não sabemos falar corretamente, gerando uma forte insegurança. É a concepção que impera, por exemplo, no livro “Não erre mais!” de Luiz Antonio Sacconi, página 64: “A lua é mais pequena que a terra. Eis aí uma frase corretíssima, que muitos imaginam o contrário. Mais pequeno é expressão legitima usada por todos os portugueses de Portugal!”
Torna – se evidente que para se tornar uma expressão correta basta que ela seja usada por todos os portugueses, como se eles ditassem a norma lingüística válida para todos os falantes. Não utilizamos os vocábulos mais pequenos, e fazemos uso constante de expressão no gerúndio, ao contrário do que é dito pelos patrícios e isso gera um eterno trauma de inferioridade, pois, o que é tido como referência é a língua falada na Europa, a língua ideal, por esse motivo não é raro ouvir brasileiros dizerem que não sabem falar direito ou não sabem português.
Uma nação sem língua é uma nação sem identidade, sem soberania e composta por cidadãos pouco patriotas e desprovidos de inteligência, por isso devemos estudar o valorizar cada dia mais a língua falada no Brasil em suas diversas facetas, buscando compreender e enriquecer o “Português Brasílico”.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BAGNO, Marcos. Preconceito Lingüístico. São Paulo, 2005.
CASTILHO, Ataliba et alii ( I: 1990, II: 1992, III: 1993): Gramática do português falado. Campinas. Editora da UNICAMP.
CITELE, Adilson. Linguagem e Persuasão. São Paulo. Editora: Ática, 1992.
CUNHA, Célio e CINTRA, Lindley. Nova Gramática do Português Contemporâneo. Nova Fronteira s\s, Rio de Janeiro, 2001.
DUARTE, Sérgio. Língua Viva. Rio de Janeiro, Rocco, 1998.
Elia, Silvio. A língua portuguesa no mundo. São Paulo. Editora: Ática, 2001.
FIQUEREDO, Cândido de. O que não se deve dizer. Volume I, 5ª ed. Lisboa, Livraria Clássica Editora.
GNERRE, Maurizio. Linguagem, escrita e poder. São Paulo. Martins fontes, 1985.
JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO: edição 15\01\98.
SACONNI, Luiz Antonio: Não erre mais! 23 ed. São Paulo, Atual, 1998.
SILVA NETO, Serafim: Introdução ao Estudo da Língua Portuguesa no Brasil. São Paulo. Ática, 1986.
TERRA, Ernani. Linguagem, língua e fala. São Paulo. Spione;1997.