domingo, 21 de setembro de 2008

A INCORPORAÇÃO DE VALORES MORAIS EM BRÁS CUBAS (UM HOMEM QUE NADA REALIZOU):BOEMIA.

UNIVERSIDADE ESTADUAL VALE DO ACARAÚ – UVA
CENTRO DE LETRAS E ARTES
CURSO DE LETRAS
PRODUÇÃO DE TEXTO

ENSAIO CIENTÍFICO

A INCORPORAÇÃO DE VALORES MORAIS EM BRÁS CUBAS (UM HOMEM QUE NADA REALIZOU): BOEMIA.

Equésia Teixeira de Lima
Aluna do curso de Letras da UVA

O termo boemia traz consigo, de imediato, a idéia de dissolução, de irresponsabilidade, de vícios, de noites de embriaguez e, por conseqüência, dias de ócio, para curar a ressaca. Durante muito tempo, essa expressão foi utilizada para falar de indivíduos que não eram, digamos, “muito responsáveis”. Pessoas sem regra ou disciplina, incapazes de parar em qualquer emprego ou de constituir e sustentar uma família. Brás Cubas incorporou essa maneira de viver, assimilou esses valores.
“Memórias Póstumas de Brás Cubas” é o primeiro romance realista, iniciando a segunda fase, a da maturidade, de Machado de Assis. Relata a história de um homem rico, Brás Cubas, de uma duvidosa descendência nobre, um tanto forjada pelos ascendentes que passa pelo mundo de maneira superficial, despreocupada e egoísta.
Muitos fatores contribuíram para que Brás Cubas tivesse uma vida boêmia: Nasce rico e é mimado pelo pai, tem uma mãe que não parece muito forte, um tio (João) que aparece como um devasso e outros parentes que, de uma ou outra maneira, influenciam na formação moral do menino terrível que ele foi.
Podemos ver no Trecho seguinte um exemplo de como ele era mimado pelo pai: “Da colaboração dessas duas criaturas nasceu a minha educação, que se tinha alguma coisa boa, era no geral viciosa, incompleta, e, em partes, negativa. Meu tio cônego fazia às vezes alguns reparos ao irmão; dizia-lhe que ele me dava muita liberdade do que ensino, e mais afeição do que emenda; mas meu pai respondia que aplicava na minha educação um sistema inteiramente superior ao sistema usado; e por esse modo, sem confundir o irmão, iludia-se a si próprio” (ASSIS, 2007, p.36).
Brás Cubas, classificado pelas críticas como o grande hipócrita da Literatura Brasileira, é um sujeito sem motivos e muito contraditório, sempre rondando a periferia do poder. Típico burguês da segunda metade do século XIX, encarna o homem que passou a vida sem conquistar nenhuma realização efetiva. Se na infância o personagem foi uma criança abastada e protegida, torna-se um jovem adulto leviano, em busca da melhor maneira de tirar vantagem. Sua conduta fica explícita quando descreve sua formação universitária na Europa: “Não digo que a universidade me não tivesse ensinado alguma; mas eu decorei-lhe só as fórmulas, o vocabulário, o esqueleto. Tratei-a como tratei o latim – embolsei três versos de Virgílio, dois de Horácio, uma dúzia de locuções morais e política para as despesas da conversação. Tratei-os como tratei a história a jurisprudência. Colhi de todas as coisas a fraseologia, a casca, a ornamentação(...)” (ASSIS, 2007).
Brás Cubas chega a deputado, perde a chance de ser ministro e passa para a oposição. Pouco a pouco vê parentes, amigos e conhecidos enlouquecer, morrer, desaparecer. No final da vida quer inventar um emplastro, que aliviaria a melancólica humanidade, curando todos seus males. É a primeira e ultima tentativa de deixar sua marca no mundo, de redimir-se de uma vida vazia e sem propósito. “O que me influiu principalmente foi o gosto de ver impressas nos jornais, mostradores, folhetos, esquinas, e enfim nas caixinhas de remédio, estas três palavras: Emplastro Brás Cubas” (ASSIS, 2007, p. 19). Mas ele não alcança seu objetivo, morrendo aos sessenta e quatro anos, depois de rever sua antiga amante, sozinho, sem deixar filhos e sem encontrar seu lugar no mundo.
Esta obra nos passa a lição de que um jovem bem nascido, com um pai rico, pode facilmente ser levado a condutas levianas de dissipação de dinheiro familiar, e criar uma série de comportamentos impulsivos, próprios da juventude, que o conduzem a conduta pessoal e social de dissipação dos recursos paternos, comprando com os mesmos favores carnais de uma mulher que se entrega fácil de maneira pulsional, aos amantes que lhe proporcionem a posse de jóias e de uma vida fácil.
Assistimos um espetáculo de puro egoísmo. Brás cubas é um ser humano egoísta, que usa sua inteligência para alcançar seus objetivos vazios e mudanos. Em vários momentos somos surpreendidos pela sua ação egoísta, e despreocupada com o sofrimento humano. Quando encontra seu amigo Quincas Borba, que estava mendigando na rua, escolhe a nota de menor valor e mais suja. Corrompe, conscientemente, Dona Plácida, dando-lhe o dinheiro que encontrou na rua, e sem remorsos, escondeu até achar um fim para as notas, cinicamente duvida dos sentimentos de Virgília, principalmente quando ela chora a morte do marido.
A morte o surpreende quando tentava inventar o emplastro, algo maravilhoso, que o deixaria famoso e mais rico. Algo que justificaria sua passagem pela Terra. Ele encerra seu relato de maneira melancólica: “Não alcancei a celebridade do emplastro, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte de Dona Plácida, nem a semidemência de Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sombra, e consequentemente que sai quite com a vida. E imaginaria mal; porque ao chegar a esse outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas. Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria” (ASSIS, 2007, p. 194).
Termina assim a história, encerrasse assim o romance. Resta uma sensação de desalento perante um homem que, ainda depois da morte, ou talvez por isso, não encontra na humanidade motivos para acreditar na vida. A vida de Brás Cubas teve o falso brilho que a riqueza pode dar, mas foi inútil desde o ponto de vista humano. Passou como um meteriorito, brilhando por um instante e perdendo-se no espaço infinito. Não deixou marcas, não semeou, todas as possibilidades que nasceram com ele, morreram e foram enterradas no mesmo caixão que viu seus ossos apodrecerem.
Ao usar a metalinguagem, Machado convida o leitor a refletir sobre a estrutura da obra e perceber dois níveis de leitura: a que revela diretamente o personagem e o que faz o objeto de crítica do autor.
Machado de Assis foi o mais ousado dos escritores brasileiros anteriores ao Modernismo (1922) na experimentação de novas formas de expressão. Em Memórias Póstumas de Brás Cubas, mostra sua desconfiança da articulação perfeita entre o texto e a realidade e procura adequar a forma ao conteúdo. A exemplo, para traduzir a frustração de Brás Cubas, quando não consegue se tornar ministro, a solução do autor foi deixar o capítulo 139 em branco. No capítulo seguinte, explica: “Há coisas que melhor se dizem calado; tal é a maneira do capítulo anterior” (ASSIS, 2007, p. 177). A vida de Brás Cubas movida pela boemia determina o falso brilho da riqueza, a inútil maneira de viver e desencadear outras atitudes como, por exemplo, personalidade estupidamente constituída de preceitos duvidosos.



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ASSIS, Machado. Memórias Póstumas de Brás Cubas. São Paulo, Martin Claret, 2007.

PESQUISA EM LITERATURA. www.planetanews.com/news. Acesso em 18.09.2008.

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